Pelo quinto ano consecutivo, Valença do Piauí figura entre os municípios piauienses contemplados com o Selo Ambiental na categoria A do ICMS Ecológico — uma honraria, ao menos no papel, que deveria refletir boas práticas ambientais, responsabilidade com o meio ambiente e gestão eficiente dos resíduos sólidos. A premiação é, oficialmente, resultado do trabalho da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, com apoio direto do prefeito Marcelo Costa.
Entretanto, um olhar atento à realidade cotidiana da cidade revela uma disparidade gritante entre a certificação recebida e a situação enfrentada pelos moradores. Ruas tomadas pelo lixo, coleta irregular, ausência de um programa eficaz de limpeza urbana, denúncias graves relacionadas ao matadouro municipal — que atualmente é alvo de investigação pelo Ministério Público — e reclamações frequentes da população compõem um cenário que pouco ou nada remete a práticas sustentáveis.
Na teoria, a premiação deveria incentivar boas práticas. Na prática, no entanto, a conquista do selo parece refletir mais o cumprimento burocrático de relatórios do que a efetiva transformação da realidade ambiental do município.
Enquanto a gestão municipal comemora de forma tímida a conquista — sem alarde, sem evento oficial, sem envolvimento da comunidade — o cidadão valenciano assiste, cada vez mais descrente, ao afastamento entre os discursos oficiais e a vida real. A repercussão quase nula nas redes sociais e nos canais institucionais evidencia que nem mesmo a própria prefeitura conseguiu celebrar com entusiasmo um reconhecimento que soa incoerente diante da rotina de abandono enfrentada nas ruas da cidade.
Um dos pontos mais críticos atualmente é o matadouro público de Valença. Denúncias de insalubridade, descarte irregular de resíduos e condições precárias de funcionamento levaram o caso ao Ministério Público, que abriu investigação para apurar responsabilidades e exigir providências. A situação é alarmante e vai de encontro aos princípios que deveriam nortear a obtenção do Selo Ambiental.
Além disso, trabalhadores da limpeza pública relatam atrasos salariais recorrentes e falta de equipamentos adequados para desempenharem suas funções. O resultado é uma cidade que, apesar de agraciada com um título de excelência ambiental, permanece suja, mal cuidada e com infraestrutura básica sucateada. A incoerência é tão evidente que moradores nas redes sociais já ironizam o selo recebido, chamando-o de "premiação de fachada".
Valença do Piauí parece viver uma dualidade: enquanto nos relatórios oficiais a cidade é referência em sustentabilidade, na prática ela segue enfrentando os mesmos problemas estruturais há anos. A coleta seletiva é inexistente, o descarte de resíduos segue sem fiscalização e as áreas verdes estão abandonadas ou tomadas por entulho.
A pergunta que ecoa entre os moradores é: como uma cidade sem ações concretas visíveis de preservação ambiental, e onde o mínimo para a saúde pública não é garantido, consegue conquistar o Selo Ambiental com a nota máxima?
A resposta, talvez, esteja na forma como os critérios técnicos são interpretados, ou na habilidade da gestão municipal em elaborar relatórios que atendam aos requisitos mínimos, mesmo que a população não veja os reflexos dessa suposta eficiência.
Valença, uma terra feliz para poucos
Diante de tamanhas contradições, é impossível não levantar uma crítica contundente à administração atual, que se mostra hábil em cumprir formalidades, mas ineficaz em oferecer qualidade de vida à população. O Selo Ambiental, que deveria ser motivo de orgulho, torna-se símbolo da desconexão entre o que se promete e o que se entrega.
Enquanto isso, Valença segue sendo uma terra feliz para poucos. Para os que estão nos gabinetes refrigerados da prefeitura, talvez. Para quem depende da cidade limpa, funcional e sustentável, o cenário é de frustração, descaso e abandono.
Em tempos onde a imagem é mais valorizada que a substância, fica o alerta: selo nenhum será capaz de mascarar, por muito tempo, uma realidade que salta aos olhos — nas ruas malcuidadas de Valença do Piauí.
Nas imagens Av. 15 de Novembro centro da cidade: