O Verdadeiro papel do vereador: Entre leis, fiscalização e representação popular

A figura do vereador é cercada de mitos e desconhecimento pela população. Enquanto muitos acreditam que seu papel se resume a "fazer obras" ou resolver problemas locais, como buracos em ruas ou falta de iluminação, a Constituição Federal e a Lei Orgânica dos Municípios definem atribuições claras — e mais estratégicas — para esses agentes políticos. Entender suas funções é essencial para cobrar transparência e fortalecer a democracia local.

O que diz a lei?

De acordo com o Artigo 29 da Constituição Federal de 1988, os vereadores compõem o Poder Legislativo municipal, responsável por legislar, fiscalizar o Executivo (prefeito) e representar os interesses da comunidade. Suas competências são regulamentadas pela Lei Orgânica de cada município, que detalha normas locais, mas sempre alinhadas à legislação nacional.

As três funções essenciais do vereador

1. Função Legislativa
   Cabe aos vereadores propor, debater e votar projetos de lei sobre temas de interesse municipal, como:
• Políticas urbanas (zoneamento, transporte);
• Educação e saúde (dentro das competências municipais);
• Cultura, esporte e meio ambiente;
• Criação de tributos locais (como IPTU e ISS).
  Exemplo: Um vereador pode propor uma lei para criar um programa de incentivo à reciclagem ou regulamentar o uso de espaços públicos.
2. Função Fiscalizadora
   O vereador tem o dever de acompanhar as ações do prefeito, garantindo que o orçamento público seja aplicado conforme a lei. Isso inclui:
• Analisar as contas municipais;
• Investigar denúncias de irregularidades;
• Convocar secretários para prestar esclarecimentos (via Comissões Parlamentares de Inquérito, CPIs municipais);
• Aprovar ou rejeitar o Plano Plurianual (PPA) e a Lei Orçamentária Anual (LOA).
3. Função de Representação Política
   O vereador é um canal direto entre a população e o poder público. Deve ouvir demandas, mediar conflitos e levar reivindicações ao plenário. Audiências públicas e visitas a bairros são ferramentas para cumprir esse papel.

O que um vereador NÃO pode fazer?

Um equívoco comum é atribuir aos vereadores responsabilidades do Executivo. Eles não podem:

• Executar obras (papel do prefeito e secretarias);
• Contratar serviços de limpeza ou manutenção urbana;
• Interferir em decisões administrativas sem respaldo legal.

A confusão ocorre porque muitos vereadores prometem resolver problemas práticos em campanhas, mas sua atuação deve ser indireta: pressionar o Executivo via requerimentos ou propor leis que obriguem o poder público a agir.

Desafios e Críticas

Apesar da importância do cargo, há obstáculos estruturais:

• Clientelismo: Alguns vereadores usam a função para trocar favores por apoio político, desvirtuando o mandato;
• Falta de assessoria técnica: Muitas câmaras não possuem estrutura para análisar projetos complexos;
• Polarização: Discussões ideológicas podem atrapalhar a aprovação de pautas urgentes.

Além disso, o baixo número de vereadores com formação jurídica ou administrativa limita a qualidade das leis propostas.

Transparência e Responsabilidade

A Lei de Acesso à Informação (12.527/2011) e a Lei Complementar 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal) exigem que vereadores prestem contas de seus gastos (verba indenizatória e gabinete). A população pode acompanhar sessões online, exigir explicações e participar de consultas públicas.

Conclusão: Um Poder em Construção

O vereador é peça-chave na democracia local, mas seu impacto depende do engajamento da sociedade. Conhecer suas atribuições permite aos cidadãos cobrar propostas claras, acompanhar votações e evitar o voto clientelista. Como ressalta o cientista político Carlos Ranulfo, "a Câmara Municipal é o termômetro da qualidade da nossa democracia: quanto mais ativa e crítica, mais forte será o controle social".